20 janeiro 2016

Aquele em que a Carol corta o pé e eu me apaixono

Dias ruins são patológicos. Geralmente os sintomas se manifestam na hora que você acorda e bate aquele peso nas costas que faz com que o esforço pra sair da cama seja duas vezes maior que o habitual. Sem mencionar, é claro, aquele gostinho amargo no fundo da boca que você confunde com o péssimo hálito matinal, mas que na verdade é só o universo te avisando que levantar vai desencadear uma série de acontecimentos inesperados, desagradáveis e provavelmente degradantes.

Seres humanos que somos, insistimos no erro.

Num desses dias fatídicos eu acordei, ignorei os presságios do cosmo e fui trabalhar. O dia foi horrível e, apesar de eu não conseguir me lembrar de nada ruim que tenha acontecido antes da grande desventura, sei que quando fui pra faculdade aquela noite eu só queria chorar as pitangas pra Carol, minha fiel escudeira.

 

Não bastasse o dia todo apanhando do mundo, em determinado momento da noite o professor resolveu que deveríamos passear pelo point universitário: a xerox. Por que economizar tempo e ir naquela xerox no bloco ao lado? Pra quê pegar o caminho seguro? Pra quê desviar da faixa de contenção das obras? Essas são perguntas cruciais que devem ser feitas antes de tomar uma decisão e, é de se imaginar, não as fizemos.

Resultado: invadimos a faixa de contenção do canteiro de obras pra cortar caminho, a Carol pisou em um vergalhão e basicamente cortou fora o pé.

Se você não conhece um vergalhão, aprecie.
Agora imagine a situação. POIS É!

As más línguas dirão que a culpa foi minha, que a Carol estava apenas me seguindo pelo mau caminho, mas eu digo que ninguém a obrigou e ela é inteiramente responsável pelo dano! Ou seja: minha consciência pesou quando mesmo depois de ela lavar o pé ele continuou sangrando e começou a adquirir uma coloração feia. Bem feia.

Quando eu questionei a Carol a respeito de detalhes daquela noite a fim de poder escrever esse post (eu prometi a ela que faria isso) ela disse: “minha grande amiga e salvadora Juju fala que está me levando pro hospital naquela hora e me deu um olhar do tipo EU NÃO ACEITO NÃO COMO RESPOSTA, POR ISSO NEM TENTE DISCUTIR COMIGO. E como amiga obediente fui com ela pro hospital”. E foi basicamente isso que aconteceu. Até o universo agir novamente.

Era uma vez eu, 22h, num centro da cidade supostamente deserto, com fome, levando minha amiga ao hospital, quando de repente não tem nenhuma vaga disponível num raio de 300m. Deixei ela na porta e avisei que voltava assim que estacionasse. Não comentei, óbvio, mas eu só faria isso se sobrevivesse à caminhada solitária por quatro (QUATRO!) quarteirões abandonados. A não ser que eu esteja aqui em espírito - e imagino que não seja o caso – sobrevivi.

Sorte do dia: terças-feiras não são movimentadas no pronto socorro.
Má sorte do dia: eu estava errada.

Esperamos, esperamos, esperamos, e s p e r a m o s, e s p e r a m o s, e   s   p   e   r   a   m   o   s...

Quando eu estava prestes a desistir de viver eu finalmente a notei: a máquina de lanchinhos. O tempo todo ela estava lá, tímida, naquele cantinho, com as molas cheias de barrinhas de chocolate e saquinhos de amendoim, me chamando bem baixinho... Juliaaaaaaaaaaana.

Definitivamente eu estava perdidamente apaixonada por aquela brilhante criação humana (literalmente brilhante!). Revirei a bolsa, os bolsos, mas infelizmente éramos de classes sociais distintas e isso impediria nosso relacionamento feliz e duradouro. Claro que não foi suficiente para impedir os flertes. 


Boatos correm por aí de que quando eu estava quase me atracando com A Máquina fomos chamadas pelo médico. Amém! Eu não aguentaria aquele dia se ele terminasse com um coração partido.

Dentro do consultório, decepcionadas pela ausência de um médico gatinho, ficamos batendo papo (“você se intrometeu no meio da minha consulta como uma mamãe galinha”) com o médico que nos foi dado enquanto ele lavava o corte.

Ao fim da conversa fiada ele nos mandou esperar mais, até uma enfermeira poder fazer o curativo. Nesse ponto da noite estávamos contrariando a 4ª lei de Newton - saco vazio não para em pé - e resistindo apenas porque transgredir as regras tem consequências severas e temos que aceitá-las.

Resumindo o fim da história, depois de muito mais espera fomos levadas a uma salinha com uma enfermeira muito gentil e uma maca instável onde ela fez o curativo da criança de 21 anos que, por sinal, pediu um pirulito por bom comportamento e por só ter chorado um pouquinho. Não ganhou, é claro, porque fez o maior escândalo! Pra encerrar o dia - e chocar a sociedade e o irmão inútil da Carol - a enfermeira fez um enfaixe digno de uma torção ou, arrisco dizer, de uma fratura... [insira aqui vários óhs de admiração]


E foi assim que saímos do hospital em grande estilo para encarar os quatro quarteirões sinistramente escuros e vazios até o carro, os quais, evidentemente, eu não caminharia sozinha mais uma vez e não importa qual fosse o estado do pé da tal da Carol. Prendemos a respiração e enfim chegamos vigilantes ao lugar onde eu tinha estacionado.

Entramos no carro, dei partida, acelerei brutalmente, lembramos de soltar a respiração e caímos na risada. Que dia ridículo!

Cada uma foi pro seu lar quentinho comer, dormir e aos poucos esquecer dos detalhes irrelevantes daquele dia, afinal até que não tinha sido dos piores... Acontece que quando temos uma amiga de verdade nos acompanhando não existe situação pesada demais ou memorável de menos. 

Esse post é um oferecimento TEXTOS QUE EU PROMETO ESCREVER E QUE MESMO DEPOIS DE QUASE UM ANO SAEM. À você, Ana Carolina.

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